Foi em 1953 que estreou pela primeira vez um filme indiano em Portugal. Numa altura em não havia televisões nos lares portugueses, Aan - Prestígio Real conquistou uma verdadeira legião de fãs, assegurando lotação esgotada durante meses a fio no cinema Odéon, na capital (os relatos variam entre 6 meses a um ano).
Tal foi a popularidade de Aan que, de acordo com o blog Coxia Central, uma das principais músicas do filme "era repetida sem cessar pelos altifalantes da Feira de Março, em Leiria!..."
E como podia o público português não ficar impressionado!
Aan - Prestígio Real foi realizado por Mehboob Khan, que realizou também Mother India, provavelmente o filme mais emblemático do cinema indiano.
Em Aan, o primeiro filme indiano filmado em technicolor, Mehboob Khan oferece-nos cenários exteriores rurais onde imperam os saris coloridos e as foices em punho, palácios sumptuosos, símbolos de poder aristocrático e tradição feudal e, principalmente, personagens exóticas e fantasiosas que ainda hoje mantêm-se o seu apelo hipnótico.
Aan é um filme fantástico!
O enredo centra-se em redor de Jai Tilak, chefe de aldeia fanfarrão interpretado por Dilip Kumar que, embora estando prometido em casamento à aldeã Mangla (Nimmi) decide quebrar os tabus de classes e conquistar a princesa Rajshree (Nadira).
Mangla é simples, jovial e apaixonada. A princesa Raj é rígida, e não aceita ver os escravos de outrora como seus iguais.
Apesar de conhecer os sentimentos de Mangla, Jai decide desafiar os preconceitos da princesa e conquistá-la gradualmente. O site philip's fil-ums descreve a princesa como tendo um quê de dominatrix e sou obrigada a concordar. A figura desta mulher forte, impassível e um bocado mázinha tem o seu apelo.
Paralelamente, existe uma trama orquestrada pelo irmão da princesa para depôr o rei, que decidira abdicar do trono em favor do poder do povo. As sugestões socialistas estavam sempre implícitas nas obras de Mehboob Khan.
O irmão da princesa é o vilão arquetipal portador de todos os vícios da aristocracia. Cruel e debochado, tem inclusivamente um harém de raparigas raptadas a quem dá a escolher: serem atiradas a um poço cheio de leões ou sucumbir aos seus avanços.
Sendo o orgulho o tema do filme ("aan" significa orgulho), o príncipe repara no orgulho de Mangla em ser camponesa e séria e, obviamente, faz dela o seu próximo alvo. Mangla morre mas leva a sua honra consigo.
É então que Jai resolve dois assuntos de uma vez só: rapta a orgulhosa princesa com o intuito de a aproximar do povo e ganhar o seu amor e, simultaneamente, com o objectivo de quebrar o orgulho aristocrático (o tal prestígio real) que os nobres tanto prezam.
Colocando de parte todo o conteúdo moral do filme, Aan - Prestígio Real sobressai como um verdadeiro filme de aventuras em que nenhum dos seus 165 minutos (na edição da GVI) é desperdiçado.
Além disso, dá-nos uma das mais fantásticas sequências de sonho do cinema indiano. Não sendo musicada, é tão ou mais memorável que a famosa sequência de 9 minutos de Awaara.
Aan - Prestígio Real não seguiu mas criou muitos clichés que ainda hoje por vezes surgem nos filmes indianos - o galã que "persegue" a sua amada sendo um deles. Mas a diferença é que em filmes com esta qualidade os clichés não se notam. Apreciam-se.
Para terminar, algumas curiosidades: quanto à edição em DVD, é difícil de encontrar, mas às vezes lá se apanham algumas cópias. Disse-me um passarinho (mentira, foi o Facebook) que neste momento há exemplares à venda em lojas de Lisboa. Por outro lado, consta que a edição mais comum, a da Eros, não tem as músicas legendadas. A da GVI, que eu tenho, tem legendas nas canções.
Quanto ao elenco, achei engraçado saber que a actriz que veio a substituir Nargis no papel de princesa, Nadira, faz parte daquele lote de actrizes indianas judias que antigamente desempenhavam os papéis que as hindus mais recatadas não se sentiam confortáveis em interpretar. Curiosamente, este foi um dos poucos papéis de Nadira em que ela não fez papel de ocidental. Hmm...
sexta-feira, 15 de abril de 2011
Aan - Prestígio Real
Escrevi sobre: Aan, Bollywood, Cinema Indiano, Crítica, Dilip Kumar, Mandira, Mehboob Khan, Nimmi, Portugal, Prestígio Real
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