A busca do Divino, do Mistério na e da Vida, a Providência e o Transcendental sempre foram demandas minhas muito pessoais. Talvez seja por isso que eu gosto tanto de filmes de terror, porque me dão ângulos de visão do mundo que me rodeia que vão para além da percepção sensorial e imediata do nosso dia-a-dia. A meu ver, e eu sei que isto vai contra o que muito e boa gente pensa, acreditar em algo - a chamada Fé - é para mim um acto de inteligência. E quando estes temas se juntam com outra das minhas grandes paixões, é tiro e queda.
O cinema religioso / espiritual / transcendental (chamem-lhe o que quiserem, eu chamo-o de bom cinema quando é feito com honestidade e humildade no tratamento do tema) sempre me fascinou e foi por isso que este Guide que vos trago aqui hoje me marcou tanto.
Realizado por Vijay Anand (cada vez mais um dos meus realizadores de Mumbai favoritos) e interpretado pelo seu irmão Dev Anand e pela belíssima Waheeda Rehman, é uma adaptação homónima de uma das mais famosas obras literárias indianas do século XX da autoria de um dos seus maiores vultos: R. K. Narayan. Se isto não bastasse, as canções são de S. D. Burman e interpretadas pela lendária Lata Mangeshkar. O sucesso do projecto parece quase inevitável, e de facto é-o. Com tanto talento à mistura, seria um pouco difícil isso não acontecer.
No entanto, a história, a princípio, é bem simples e quase mundana. Senão vejamos: depois de um breve prólogo em que vemos Dev Anand a abandonar uma prisão depois de um período, para já, indeterminado de tempo e por razões ainda por apurar, vamos acompanhá-lo numa caminhada na direcção contrária da cidade que, pelos vistos, foi a responsável e testemunha do seu enclausuramento. Nessa sua caminhada, que pronto se adivinha longa, vão-lhe ser dadas vestimentas de Sadhu para substituir as suas, que cedo se rompem devido ao desgaste da viagem. É de assinalar neste ponto que este pequeno gesto de benevolência vai ser crucial para o desenrolar não só da sua história pessoal, como também do resto da trama. E mais não digo.
Digo só que o enredo é praticamente todo contado em forma de flashback e vai ser assim que iremos ficar a saber a razão da sua prisão e de que forma a sua linha de vida se cruza com a da personagem interpretada por Waheeda Rehman, Rosie. Não posso é deixar de vos contar que esta personagem feminina tem o seu quê de fascinante, visto ser uma mulher que casou por conveniência com um homem bem mais velho do que ela, mas bem mais rico e que, por acréscimo, só vai conhecer o Amor nos braços - já estão a adivinhar, não já? - de Raju, interpretado por Dev Anand. O Amor e também o sucesso na carreira, porque o sonho de Rosie é ser bailarina profissional, algo que não é lá muito bem visto pela sociedade onde vive, facto esse que não a vai impedir de atingir os seus sonhos, embora a princípio isso seja um impedimento enorme não só da parte do seu incompreensível marido, como também de si mesma, visto que vai ter momentos de grande falta de auto-confiança e de depressão.
E é aqui também que este Guide brilha, porque mistura psicologia com espiritualidade de uma maneira raramente vista no cinema. Desenganem-se, no entanto, se pensam que este é um filme sério e nada divertido. Nada disso. Isto é Bollywood no seu melhor e se deitarem uma espreitadela ao clip que vos deixo em baixo, ficarão com todas essa dúvidas dissipadas. Tem, aliás, das melhores sequências musicais jamais visionadas por este humilde escritor. É realmente o melhor de dois mundos para mim: cinema agradável aos olhos com o bónus de uma mensagem. O final é simplesmente avassalador e deixou-me em lágrimas.
Fica aqui então esta altíssima recomendação para um filme que eu considero obrigatório para todos os amantes do cinema de Mumbai e também para quem leu estas linhas e ficou com vontade de saber como é que Raju passou de guia turístico para guia espiritual.
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
Guide
Escrevi sobre: Bollywood, Cinema Indiano, Crítica, Dev Anand, Guide, Lata Mangeshkar, Portugal, R. K. Narayan, S. D Burman, Vijay Anand, Waheeda Rehman
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1 comments:
Este filme é uma preciosade, uma beleza, uma luz. E já disse mil vezes: o filme é da Waheeda.
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