Fez este mês de Janeiro 59 anos - 59! - que estreou em Portugal o filme O Rio Sagrado do realizador francês Jean Renoir.
Não sendo um filme indiano na génese, O Rio Sagrado é um filme muito indiano no conteúdo e na forma.
Tendo como fio condutor as memórias autobiográficas da narradora, O Rio Sagrado usa o pretexto de contar a história do amor platónico de uma adolescente por um soldado veterano para tecer um longo e apaixonado poema de amor pela Índia.
A história é simples e encantadora. Com a chegada à Índia de um antigo soldado americano que perdera uma perna na guerra, os jovens corações de Harriet, Melanie e Valerie sentem-se imediatamente atraídos por este homem misterioso e, aparentemente, inatingível.
Enquanto Valerie testa a sua maturidade com flirts e insinuações, Melanie sente a paixão contida de uma rapariga indiana tradicional, ainda que o pai, um viúvo inglês, lhe dê liberdade para seguir o seu próprio caminho.
E à medida que Harriet - a narradora - vai tentando cativar a atenção do Cap. John com histórias sobre a Índia e os seus deuses e costumes, é na verdade o espectador que é seduzido pelo encanto de uma existência simples que, como um rio, acompanha os ciclos naturais da vida recomeçando o seu curso uma e outra vez.

E agora que já tive o meu momento de epifania e de partilha de sentimentos, voltemos ao filme.
Sobre a morte de Bogey, o pai de Melanie diz que pelo menos foi um indíviduo que se salvou. Um que conseguiu morrer ainda criança, sem ter passado pela corrupção e pela hipocrisia da idade adulta. Um que viveu a vida inteira (ainda que curta) a dar importância ao que é realmente importante e sem nunca ter pudor de tocar com as mãos na terra.
Outro dos meus momentos preferidos do filme - talvez por ser tão romântico, talvez por haver dança - é quando Harriet conta a história de dois noivos que só se conhecem no casamento, usando como intérpretes Melanie e o seu noivo prometido, Anil.
A noiva, desgostosa por ir casar com outro que não o seu amado, fica radiante quando vê que o noivo é, afinal, aquele de quem gostava.
E assim assume o papel de Radha que expressa o seu amor por Krishna através da dança:
Ao longo do filme pensei muitas vezes "Isto está a ser tão Satyajit Ray..." e de facto estava, pois como vim a descobrir foi a participação de Ray como assistente de realização em O Rio Sagrado que catapultou a sua própria carreira como realizador.
De resto, a minha amiga internet permitiu-me também descobrir que a maioria dos actores do filme não eram realmente actores e que o próprio produtor se lançou a este projecto apenas para demonstrar à sua mulher, que trabalhava na MGM, como é que se fazia um filme bom e que enchesse salas de cinema.
De tudo isto saiu, afinal, um filme perfeito.
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